As peças orçamentárias funcionam como um contrato entre Governo e a Sociedade, e, por força de lei, devem ser apresentadas ao público antes de sua votação. Contudo, por meio de audiências repletas de tecnicalidades e protocolos, as audiências públicas acabam distanciando a participação popular e dificultando a capacidade de influenciar alocação de recursos.
Ao longo da década de 1990 e no início dos anos 2000, outra forma de participação popular, diretamente voltada para a alocação de recursos, se popularizou: o Orçamento Participativo (O.P. como eram chamados).
O Orçamento Participativo teve seu início em 1989 na prefeitura de Porto Alegre, durante a gestão de Olívio Dutra (PT). Razão pela qual costuma ser associado às gestões municipais do Partido dos Trabalhadores, embora muitas prefeituras, inclusive em gestões não petistas, tentaram diversos modelos de Orçamento Participativo.
O debate sobre O. P. foi intenso e caminha até hoje por diversas vias, forma institucional de cada modelo que foi implantado, capacidade de interferir na agenda pública dos O.P.s, sua capacidade de criar elementos para uma democracia mais participativa, entre outros.
Do ponto de vista institucional, o relacionamento entre ciclo orçamentário e o O.P. é evidente, interfere transversalmente em todas as rotinas do planejamento do orçamento. E, por isso, a reticência das equipes em terem suas rotinas alteradas pelo processo decisório do Orçamento Participativo gerava conflitos. Contudo, modelos de integração entre a prática da orçamentação e o processo decisório dos O.P. foram solucionando esse problema ao longo do tempo.
Ainda assim, durante a execução orçamentária, o poder executivo pode realocar os gastos, desprezando as demandas coletadas pelo O.P. No Brasil, o poder executivo possui alguma – alguns diriam muita – liberdade para realocar as despesas após o orçamento ser aprovado. Com isso, as demandas do O.P. podem não se realizar em virtude da realocação de créditos orçamentários.
Para desfazer esse problema, muitos modelos de O.P. começaram a tentar incluir demandas no PPA. Isso porque em um horizonte de 4 anos, e com a obrigatoriedade de relacionamento entre PPA e LOA, seria possível garantir que as demandas não fossem perdidas na execução orçamentária. Outra forma de garantir a execução das ações selecionadas pela participação popular tem sido vincular algum percentual da receita ao O.P.
Entretanto, após um período de boom, muitos municípios que possuíam O.P. deixaram a prática de lado. Algumas das críticas recebidas enfatizam o fato de o O.P. decidir sobre uma parcela muito pequena do orçamento. Outras, que o O.P. não conseguia exercer suficiente pressão na agenda pública. Em muitos casos, os Orçamentos Participativos eram apenas formais. Ou ainda, em casos extremos, completamente influenciados pelos governos, não se constituindo em uma prática de participação popular.
Atualmente outras formas de participação popular, novas e antigas, têm ganhado destaque, entre elas as audiências públicas para a confecção dos planos municipais de longo prazo, assim como os conselhos.
Com o movimento dos estudantes secundaristas ocupando suas escolas e exigindo participar das decisões que afetem suas vidas, o debate sobre a participação popular nas políticas públicas de modo direto começa a ganhar espaço, ainda que incipiente. Nesse caso, a participação popular não estaria somente associada à alocação de recursos, mas sim ao desenho e execução das políticas. Ainda que seja cedo para afirmar, a participação direta da população nas políticas públicas, desde o desenho e até a implantação, e a atuação dos conselhos, pode ser um novo caminho que suplante o O.P.
Luiz Felipe Ambrózio é mestre em Economia Política pela PUC-SP. Com experiências diversas no setor público, atua há mais de 10 anos na área de planejamento orçamentário e estatística fiscal.