Hoje, no Brasil, há um consenso bem estabelecido quanto à crise que vivemos em nossas instituições representativas. Em efeito, a sociedade já não parece ter o sentimento de que está sendo devidamente representada em suas aspirações e necessidades, por aqueles que são eleitos a través voto, nos diferentes níveis de governo (municipal, estadual, nacional).
A essa crise de representatividade, vivida tanto pelo legislativo quanto pelo executivo, se soma uma descrença cada dia mais acentuada em outros espaços importantes para o exercício da cidadania: as instituições e mecanismos de participação social.
A Constituição Cidadã e as formas de participação institucionais
Como se sabe, nossa Constituição Cidadã prevê uma série de instâncias e canais para que a sociedade civil possa exercer um papel na elaboração e gestão das políticas públicas e, mais amplamente, participar da vida pública para além das eleições de seus representantes.
Apesar do avanço que representou o texto constitucional, com o passar dos anos, foi-se constatando uma série de deficiências nas instituições de participação social e cada vez mais se questionou a efetividade da mesma, apesar da multiplicação de conferências e conselhos nos anos 2000. Em 2014, tentou-se uma refundação com o decreto que institui a Política Nacional de Participação Social, sem grandes alterações, mas organizando as diferentes instâncias, órgãos e espaços, os resumindo a: conselho de políticas públicas (permanente), comissão de políticas públicas (temporária), conferência nacional, ouvidoria pública federal, mesa de diálogo, fórum interconselhos, audiência pública, consulta pública e ambiente virtual de participação social.
Com o fracasso da proposta não foi possível avaliar em que medida o novo Sistema Nacional de Participação Social teria aumentado a efetividade da participação social. Tudo indica, entretanto, que, mais do que no desenho institucional das instâncias de participação o problema está na implementação. Pressente-se, então, que da mesma forma que estudos sobre a implementação de políticas públicas foram extremamente importantes para identificar os fatores de sucesso na implementação das mesmas, estudos sobre a implementação dos mecanismos de participação parecem essenciais[1].
Explorasse também a pista de que os próprios processos de formulação e implementação de políticas públicas tenham que ser revistos, abrindo espaço efetivo para a participação.
As novas formas de participação social
Nesse contexto bastante desafiador surgem novas ideias, iniciativas, novos modelos, que devem ser integrados, fazendo evoluir as formas oficiais de participação. Dentre essas iniciativas estão os Laboratórios de inovação cidadã.
A inovação cidadã é um processo que busca a construção de soluções para problemas (sociais, ambientais, econômicos) com tecnologias (digitais, sociais, ancestrais) e metodologias inovadoras, através do envolvimento da sociedade civil ou de uma comunidade específica, na qual esse desafio existe. Tem por princípio que os cidadãos já não podem ser somente receptores passivos de ações institucionais, para se tornar atores e produtores de suas próprias soluções, coproduzindo política pública. Ela aponta para uma diversidade de caminhos, como por exemplo:
– Realização de consultas aos cidadãos para o desenvolvimento de obras, serviços, políticas públicas e processos de reforma do Estado, utilizando-se os meios digitais para os processos de consulta;
– Concepção de planos de governo que incluam a inovação cívica como mecanismo de procura de soluções, através de convocatórias públicas e abertas para o desenvolvimento de soluções colaborativas para problemas e desafios sociais e/ou comunitários;
– Interação harmoniosa dos serviços municipais com os coletivos ou associações, realizando encontros por zonas que permitam identificar necessidades e soluções, entre outros.[2]
Os desafios da democracia representativa
Tudo leva a crer que a crise da democracia representativa tenha que buscar soluções no aprofundamento da democracia participativa. Ainda assim, resta, além das reformas institucionais e criação de novos dispositivos, integrando os avanços tecnológicas, um esforço grande a ser feito junto à sociedade, para mobilizá-la para o que não deixa de ser uma ação política. Mobilizar o cidadão parece ser o grande desafio e para isso é preciso envolvê-lo, não só intelectualmente, mas também criando um interesse genuíno, inteiro, quase emocional, que o toma em todo seu ser, pela possibilidade de transformar a própria realidade. No fim, a participação é uma forma de engajamento, e o engajamento um envolvimento.
[1] Sobres os desafios de implementação da participação social, ver artigo de Wagner de Mello Romão: http://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/2160-6031-1-pb.pdf
[2] Sobre o Laboratório de Inovação Cidadã, ver http://www.ciudadania20.org/pt-pt/