Passadas as eleições, é comum que as pessoas lembrem em quem votaram para prefeito, mas nem sempre se recordam do candidato a vereador. Isso ocorre por motivos diversos, entre eles o modelo e recursos disponíveis para campanha, tempo de mídia, as regras para elegê-los, prestígio partidário enquanto lideranças, responsabilidades e número de concorrentes.
O Prefeito, o Vice e o Programa de Governo
O prefeito possui função executiva, ou seja, lhe compete elaborar e fazer funcionar políticas públicas por meio de gestão articulada, bem como responder por elas. O vice, embora tenha funções executivas, deve oferecer suporte ao líder, que é o prefeito. Durante o período de campanha, o candidato a prefeito apresenta à população o programa de governo que pretende implantar no município. Este documento contém propostas para áreas diversas como, por exemplo, educação, saúde, mobilidade, segurança e geração de empregos, o que torna indispensável o conhecimento prévio destes conteúdos por parte do eleitor. Se o eleitor não conhece o programa de governo dos candidatos, dificilmente terá clareza do que cada um pretende e como deseja fazer.
Os programas de governo não são escritos de maneira aleatória e tampouco desenvolvidos exclusivamente pelo candidato. Assessores e profissionais de áreas diversas são convocados para elaborar, junto aos políticos pertencentes ao partido do candidato, as diretrizes para a gestão da cidade. Em alguns casos, a sociedade também participa da elaboração deste programa por meio de plenárias que o próprio partido organiza – neste caso, quando o partido é mais aberto à participação popular; quando existe a ideia de “governar com o povo”, o que é diferente de “governar para o povo.” Trata-se, portanto, de um trabalho complexo, elaborado por equipes diversas.
O conteúdo de cada programa contém o DNA do partido do candidato (comporta sua ideologia, cultura, anseios e métodos), e funciona como uma cartilha que o candidato a prefeito e vice devem, supostamente, seguir se forem eleitos – isso porque durante um mandato existem contratempos e demandas capazes de influenciar conjunturas, que impedem que os eleitos realizem todas as propostas, bem como podem descobrir terem superestimado a capacidade de realização ao prometerem mais do que poderiam cumprir. Outro ponto é que o vice (que pode ser representante de um partido coligado ao partido do candidato a prefeito), por ser, geralmente, menos representativo para a candidatura e gestão do prefeito, pode não contribuir de maneira harmoniosa para a execução do programa, ainda que este tenha sido vitorioso nas urnas.
Ocorre que a relação entre os candidatos ao Executivo, prefeito e vice-prefeito, pode ser tanto construída com base numa lealdade por afinidade, como numa lealdade por interesse. Enquanto a lealdade por afinidade seria uma parceria em prol de um projeto comum, em que o vice dá suporte por crença e vontade, a lealdade por interesse faz com que o vice dê algum tipo de suporte por necessidade de sobrevivência dele próprio e do prefeito a partir da coalizão em que forças foram somadas para conquistar a vitória, chegar e manter o poder. Essa dinâmica de suporte possui muitas nuances e pode mudar com o tempo, como em qualquer outro tipo de relação.
A relação com a Câmara dos Vereadores
Melhor para o prefeito quando ele consegue o suporte do vice, inclusive para negociar medidas com a câmara de vereadores, já que ele precisará de apoio legislativo para executar as políticas públicas propostas. O ideal é haver uma câmara favorável ou pelo menos flexível ao prefeito e ao vice, pois, se cabe ao prefeito sancionar (ou vetar) leis aprovadas na casa legislativa, também cabe elaborar propostas de lei quando julgar necessário. O fato é que, dificilmente, um prefeito consegue governar sozinho, apesar de ser a liderança principal de uma legislatura. O vereador, afinal, também é responsável por fiscalizar as atividades do executivo – como cuidar do orçamento, fiscalizar gastos e o cumprimento da lei –, portanto, pode atrapalhar muito o governo eleito se ele for de oposição. Um bloco de vereadores unidos em oposição pode tornar a vida do prefeito muito difícil, porém, também é possível, em alguns casos, que estes mesmos vereadores votem a favor do executivo se houver interesse comum a partir do que acreditam ou prometeram aos seus eleitores.
Em outras palavras, menos importante que o candidato a prefeito, o vereador trabalhará com pautas específicas, geralmente segmentadas ou com um recorte menor. As propostas do vereador são como partes a serem integradas no plano maior de gestão da cidade – pelo menos é o que deve acontecer na prática, o que não impede um candidato a vereador de ser eleito se não tiver propostas que se coadunam com as mesmas do candidato a prefeito mais forte. Pois, se em política quase tudo depende de negociação, no legislativo ela vale ouro, já que é o voto de um coletivo de vereadores (a maioria) o que conta na hora de uma decisão. Isso por que eles trabalham em comissões que averiguam projetos e emendas a serem votados em plenário, além de proporem seus próprios projetos, imprescindíveis para a manutenção dos laços com seus respectivos eleitorados.
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Os Vereadores
Na política municipal, o vereador seria o personagem mais disponível para atender a população no dia a dia, uma vez que aglutina votos, sobretudo, em distritos ou núcleos de interesses muito bem definidos, como a defesa de determinada região ou equipamento público da cidade, causa das mulheres, produtores “X” “Y” ou “Z”, LGBT, negros, mães, indígenas etc. Outro ponto é que a população pode ir às sessões plenárias e conversar com o vereador e secretários em seus gabinetes. Mas, apesar de, em tese, estar mais em contato com a população, por lidar com questões micro, são muitas vezes esquecidos por aqueles com os quais não mantêm interação periódica direta; esquecimento este que não ocorre com o prefeito, que lida com questões de gestão macro, que causam impacto na vida de uma população maior e todo andamento da cidade, apesar de ele não manter, em geral, contato direto com a população.
A regra de eleição para vereadores, tampouco favorece o relacionamento destes políticos com o eleitor, uma vez que, por essa via, existe a regra do quociente eleitoral, e a possibilidade de o eleitor votar na legenda partidária ao invés de votar diretamente em um candidato. Ou seja: às vezes os vereadores eleitos nem sempre são aqueles que foram escolhidos pelas pessoas; mas sim que foram puxados por votos em outro candidato do mesmo partido, ou por votos do partido.
O prefeito ainda acaba sendo mais lembrado que o vereador por estar frequentemente na mídia respondendo pelo governo como um todo. Além disso, o número de candidatos a prefeito é menor do que vereadores para cada vaga, que pode variar entre 9 e 55, a depender o tamanho da cidade. Se por um lado o eleitor precisa escolher a proposta de um candidato a prefeito e vice entre uma dúzia deles (ou pouco mais ou pouco menos), por outro, precisa escolher um candidato a vereador entre dúzias deles, ou centenas quando as disputas ocorrem em municípios grandes.
Por Juliana Fratini